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Protegendo a vida

julho 3, 2019

Revista Emergência

Por Natália Andrade


 

Importância de sprinklers em ocupações onde há pessoas que requerem cuidados especiais

Uma grande preocupação para nós, profissionais envolvidos com Segurança Contra Incêndio, é referente às exigências ou a falta delas de sistemas automáticos de proteção

contra incêndio. Uma principal medida, em termos de eficiência e pelo automatismo, é a instalação de sistemas de sprinkler. O sistema de sprinkler é uma medida de Segurança Contra Incêndio ativa, em que a água é o principal agente extintor do fogo agindo de maneira direta e automática pelo bico, que possui um elemento termo-sensível projetado

para acionar em temperaturas pré-determinadas com vazão e pressão para controlar

ou extinguir um foco de incêndio. Sem dúvida nenhuma, a água é a melhor opção para salvar vidas em um incêndio, pois age efetivamente no combate ao fogo, tem grande poder de absorção de calor, é um agente seguro, não corrosivo e não tóxico. Este sistema

reduz, assim, os danos causados ao meio ambiente, devido à fumaça tóxica de resíduos contaminados que são gerados a partir da queima, ao patrimônio, pois perdas materiais, estruturais e de equipamentos são inevitáveis, e, o principal, preserva a vida, já que atua

no início do incêndio, dificultando sua propagação pela edificação, aumentando o tempo de evacuação do prédio e diminuindo a emissão de fumaça tóxica, o que é a principal causa de morte em incêndios.

VIDAS

Hoje, o nível das exigências de Segurança Contra Incêndio tem como parâmetro o grau de risco das edificações, que, por sua vez, tem como base a carga de incêndio, que envolve o potencial calorífico a ser liberado pela combustão completa de todos os materiais contidos

na área a ser protegida. Esta medida é importante para se determinar o quão poderoso será o fogo numa situação de incêndio, porém é primordial considerarmos também o “grau de risco” de uma vida, já que vidas são todas iguais, independente da ocupação da qual ela

estará fazendo parte. Para determinar se é obrigatória a utilização de um sistema de sprinkler, deveríamos olhar não somente para o grau de risco da edificação, como também visar de forma humanitária as pessoas que ocuparão o local, como elas se comportarão diante de um sinistro e, assim, evitaríamos mortes ou estas seriam reduzidas ao máximo. Em locais onde existem pessoas que requerem cuidados especiais, há dificuldade para locomoção de grande parte desta população, como é o caso de hospitais, creches, hospitais psiquiátricos e asilos. O maior número de pessoas que habita estas edificações envolve aquelas que buscam proteção, apoio, saúde e segurança, e que, em caso de incêndio,

necessitam de ajuda e auxílio de outra com completa habilidade para abandonar o local, tudo isto sem causar pânico em um processo complexo que resulta num tempo maior de evacuação, já que pacientes, idosos e crianças necessitam de suporte.

Agora, imagine, em um caso real de incêndio, a primeira atitude a se tomar é a evacuação do prédio de maneira segura e rápida, porém quando existem vidas com mobilidade limitada, este fundamento torna-se enfraquecido, já que teremos um novo desafio a cumprir:

evacuar o local em tempo a salvar vidas sem comprometer a estabilidade física.

No caso de um hospital, por exemplo, os pacientes necessitam de condições adequadas

e equipamentos de emergência para serem transportados. Tudo isto sem causar pânico, em uma sequência complexa que pode até parecer impossível a evacuação. Suponhamos também um sinistro descontrolado, a ponto de danificar a estrutura do edifício, para onde

levaremos estes pacientes, as crianças e os idosos? Teremos infraestrutura para

isto? Será que teremos condições de deslocamento e abrigo?

Segundo dados do Relatório Técnico da Análise do Sinistro na Boate Kiss, em Santa Maria/RS, de 04 de fevereiro de 2013, realizada pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio Grande do Sul, uma das razões do maior número de vítimas no incêndio

foi a dificuldade de desocupação do local. Dificuldade esta gerada pela existência de apenas uma saída de emergência, quantidade elevada de pessoas na edificação, má identificação e procedimentos que impediram a saída de boa parte dos ocupantes. Como lição, é determinante o tempo que se tem para uma evacuação do local até um local seguro.

TEMPO

Em caso de incêndio, o tempo é valioso. O fogo é complexo, seu comportamento é imprevisível. Levam-se poucos minutos para que o foco do incêndio se transforme em uma eventual tragédia, a ponto de causar danos irreversíveis ,ao patrimônio, meio ambiente e, o pior, perdas de vidas humanas. Nas edificações citadas anteriormente, em caso de incêndio, o tempo de evacuação será maior que em outras edificações até mesmo de risco alto, já que existem pessoas com mobilidade limitada. E, como já citado, a principal causa

de mortes nos incêndios é a inalação da fumaça com gases tóxicos. Então, quanto maior o tempo dentro da edificação, maior será a inalação e a probabilidade de uma eventual fatalidade é consequentemente aumentada. Unindo estes três pontos: evacuação,

tempo e a não inalação de gases tóxicos, podemos afirmar que o sistema de sprinkler é uma medida muito eficaz para um incremento das chances de sobreviver em uma situação de incêndio, pois contribui de maneira favorável, significativa, direta e ativa, ou seja, em caso de sinistro, o sistema é acionado automaticamente, sem a necessidade de manuseio

humano, controlando o incêndio no princípio, neutralizando a emissão de grandes quantidades de gases tóxicos e assim aumentando o tempo para evacuação total da edificação.

Hoje, infelizmente, a legislação contra incêndio no Brasil não é uniforme, varia

de estado para estado, tendo no estado de São Paulo, o mais atualizado e exigente em termos de Lei.

LEGISLAÇÃO

Mesmo assim, o Decreto Estadual 56.819/2011 do Estado de São Paulo, somente exige o sistema de sprinklers para os Grupos E-5 (Creches), H-2 (Asilos e Hospitais Psiquiátricos) e H-3 (Hospitais) – onde, com certeza, existem pessoas com algum tipo de dificuldade de locomoção – quando a altura da edificação exceder 30 metros. Conforme o Artigo 3° do mesmo Decreto tem-se como altura da edificação a medida em metros do piso mais baixo ocupado ao piso do último pavimento, com algumas exceções no Artigo 20°, como subsolos

destinados para uso exclusivo de estacionamentos de veículos, vestiários, áreas técnicas sem aproveitamento humano, pavimentos superiores destinados à casa de máquinas, entre outras. Desta maneira, se a construção não exceder a altura estabelecida o sistema não será exigido. Por sua vez, existe a Instrução Técnica n° 09/2011 – Compartimentação Horizontal e Compartimentação Vertical – que determina áreas máximas de construção, que variam conforme a ocupação e altura da edificação. Tal medida é vista como proteção passiva contra incêndio, pois tem a função de impedir, por um determinado período de tempo a passagem de chama, fumaça e calor, não agindo diretamente no combate. Para que esta medida de proteção seja isenta e, como consequência, áreas acima do limite sejam construídas, o sistema de sprinkler deverá ser instalado.

Porém, a surpresa é que, dos grupos citados anteriormente, somente há exigência de compartimentação horizontal e vertical para o grupo H-3 (Hospitais). Os demais E-5 (Creches) e H-2 (Asilos e Hospitais Psiquiátricos) são isentos de compartimentação, independente da altura da edificação e área da edificação.

Sendo assim, podemos concluir que, pela legislação, nunca será exigido o sistema de sprinklers em edificações de grupos E-5 (Creches) e H-2(Asilos e Hospitais Psiquiátricos), independente da área construída, quando respeitado os 30 metros de altura. Fica para reflexão, tanto para a sociedade, profissionais e órgãos competentes, quanto à necessidade de mudança para a aplicabilidade do sistema de sprinkler. Enfatizar que para a determinação da obrigatoriedade da instalação do sistema, seja considerado não somente o grau de risco da edificação, como também o lado humanitário, olhar para as pessoas que farão parte da edificação. Pensar que existem vidas nestes locais, e que elas necessitam do auxílio do próximo para evacuação. Já é difícil a evacuação em locais onde não há dificuldades de locomoção, imagine em locais onde o auxílio é necessário, onde a mobilidade é restrita.

MUDANÇA

Infelizmente, existe a probabilidade de uma eventual tragédia, já que dados oficiais

comprovam que a sobrecarga elétrica é uma das principais causas de incêndio. Sendo assim, em qual edificação não há risco elétrico? Sem contar que existem diversos fatores que contribuem para o início de um incêndio, incluindo acidentes em cozinhas, manutenção e por que não citar, infelizmente, os intencionais?

No que diz respeito à legislação brasileira, somente houve uma movimentação para atualização e mudança das exigências das medidas de Segurança Contra Incêndio, após a grande tragédia na boate Kiss. A partir disto, iniciaram-se estudos e revisões para a aplicação do sistema de sprinklers em locais de reunião de público, que se enquadram em

risco leve. Relacionando a prevenção contra incêndio no contexto normativo e legislativo, suas atualizações e revisões são baseadas nos eventos trágicos, nos quais há perdas de vidas. Porém, se estamos observando uma lacuna existente quanto à exigência de instalação de um sistema tão eficaz em seu desempenho, capaz de controlar ou até mesmo extinguir um incêndio, atuando de maneira automática e protegendo vidas, não podemos aguardar o dia em que seja inadiável, de maneira emergencial, a revisão de sua obrigatoriedade na legislação. Uma vez que isto aconteça, provavelmente, vidas terão sido perdidas. A história já nos mostra que os códigos e legislações foram criados ou atualizados

somente após grandes tragédias. Lembramos o que aconteceu após os incêndios nos edifícios Andraus e Joelma. Fica a pergunta: por que não aprendemos e nos antecipamos, evitando mais mortes desnecessárias? No Canadá não foi diferente. Em janeiro de 2014, houve um incêndio numa casa de idosos em L’Isle-Verte que resultou na perda de 32 vidas. Após o incêndio, a Governadora de Ontario, Kathleen Wynne, anunciou a retroatividade da exigência de sprinklers em todos os asilos e casas de repouso em sua província, já que na

época do incêndio era exigida a instalação apenas em construções novas, nas edificações existentes era válida a legislação vigente na época de aprovação.

Podemos ver que o Canadá aprendeu com a dor, portanto, conhecemos a importância da prevenção para eles. No famoso caso da boate Kiss, como dito antes, esperamos acontecer para tomarmos as devidas medidas corretivas, mas poderíamos ter aprendido antecipadamente, pois a história também nos apresenta pelo menos dois casos idênticos, em termos de ocupação, início do incêndio, materiais de acabamento e, infelizmente, grande quantidade de mortes. Refiro-me aos casos da boate The Stationde Rhode Island, em 2003, e República Cromañón, de Buenos Aires, em 2004.

CUSTO

Temos que quebrar o tabu no que diz respeito ao alto custo da instalação, uma vez que estamos habituados a instalar o sistema em áreas de risco diferentes da categoria leve, onde, por sua vez, as exigências são maiores e a legislação é mais restritiva. Existem diversos pontos que diminuem o custo da instalação, e para seu dimensionamento as exigências são mais brandas, ou seja, o espaçamento entre bicos e sua área de cobertura é

maior, diminuindo, assim, o número de bicos de sprinklers, o tempo mínimo para o funcionamento do sistema é menor, sendo de 30 minutos, resultando numa reserva de incêndio menor, e a área máxima de proteção por válvula de governo e alarme será maior. Já foi comprovado por meio do estudo “Custo da instalação do sistema de sprinklers na boate Kiss”, elaborado pelo engenheiro Ricardo Itsuro Shirakawa, coordenador do Comitê

Técnico da ABSpk, apresentado no 1° Congresso Brasileiro de Sprinklers, o baixo investimento da instalação do sistema em área de risco leve.

Todos temos entes queridos, sejam filhos, pais, avós, irmãos que estão diariamente em uma edificação de risco leve. Conseguimos nos sentir seguros sabendo que, muito provavelmente, poderão estar ocupando locais sem a correta ou até mesmo nenhuma proteção?

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